Há cenas em que a realidade é o tempo presente, ou são flashbacks de uma mente atormentada que não deixa o passado ir embora? Até onde o profissional e o pessoal podem ir de mãos dadas? Quando você pisa e entra na tal ilha do medo, não há como sair mais (Casablanca), e de repente tudo se torna um quebra-cabeça mental. Psicose, Janela indiscreta e Um corpo que cai, de Hitchcock, percebe? Então esqueça os sustos fáceis e a tensão gratuita. Talvez falte apenas o bom e velho humor negro, tão presente em Os infiltrados, mas qualquer tipo de humor aqui dificilmente acharia lugar pra se encaixar em um cenário caótico de investigação! A parte técnica ajuda a construir um film noir, abusando de uma trilha sonora pesada e quase sempre presente nas cenas e de uma direção de arte fria, rústica, dark, que remete á de Sweeney Tood, dos italianos Dante Ferretti e Francesca Lo Schiavo. Seria o filme com a melhor parte técnica de Martin Scorsese? Arrisco a concordar. Detalhe: A trama se passa nos anos 50, mas isso é apenas um detalhe, realmente, para uma trama maior do que a apresentada no início.
Década de 50, época das mudanças no mundo, do holocausto, da criação do rock, de grandes revoluções, talvez os tempos de maior incerteza do homem sobre o seu futuro e o futuro da sua família. Metáforas em um filme que sabe usá-las, metáforas em um projeto cheio de belas imagens (A cena do adeus entre Teddy Daniels e sua esposa entre as cinzas que caem do telhado é uma cena que não sairá da minha memória tão cedo.), combinando visual com sonoplastia rica entre as paredes de um sanatório macabro com goteiras e pesadelos eternos, onde a loucura é a principal hóspede. E nós somos apenas as marionetes do lado de cá da história. Mas calma, o mais improvável dos personagens também é!
O que era pra ser afiado sem dúvida está, é verdade, mas não tão afiado como a capacidade, realmente de se notar, de Scorsese narrando à história além do que a tela mostra. Afinal, nós vemos apenas o que o diretor que mostrar e transmitir com um filme, e tiramos as nossas conclusões enquanto a obra se mantém viva nas nossas mentes, por alguma razão de identificação ou prazer. Mas quando um filme satisfaz com a presença ou a ausência de respostas, e flerta com os nossos medos de uma maneira profunda e rara hoje em dia, como não classificar A ilha do medo como uma das melhores obras de um dos melhores diretores do mundo?
NOTA: 9/10
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